QUIBE DE ALHO PORÓ, DEBRET E O BARÃO DE ESCHWEGE


O desenhista e pintor francês Jean-Baptiste Debret (1768-1848), cuja obra é de grande valor para o estudo da história do Brasil no início do século XIX, integrou a missão artística francesa que veio ao Brasil em 1816, permanecendo por 15 anos, exercendo intensa atividade didática, escreveu e ilustrou “Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil” em três volumes (1834-1839) documentários sobre a natureza, o homem e a sociedade fluminense no princípio do século XIX.



 
Durante sua estada em nosso país (1816-1831), Debret retratou-os e sobre eles deu o seu depoimento, afirmando que caracterizavam “tanto pela capacidade como pela velhacaria que põem no seu comércio exclusivo de negros novos e de escravos civilizados”, informando que “os primeiros ciganos vindos de Portugal desembarcaram na Bahia, e se estabeleceram, pouco a pouco, no Brasil, conservando nas suas viagens, as habilidades do povo nômade”. E contaminado, ele também, pelo preconceito, afirma: “Esta raça desprezada tem por hábito encorajar o roubo e praticá-lo; roubam sempre alguma coisa nas lojas onde fazem compra e, de volta para casa se felicitam mutuamente por sua habilidade repreensível”. No Rio de Janeiro eles se instalaram na Rua dos ciganos (atual Rua da Constituição) até 1808, quando procuraram outras localidades mais próximas das estradas do interior, levados pelo seu comércio de ouro e de cavalos.
 
GILFRANCISCO: jornalista, professor da Faculdade São Luis de França e membro do Inst. Histórico e Geográfico de Sergipe. Em CIGANOS, UM MILÊNIO DE HISTÓRIA.

QUIBE DE ALHO PORÓ



500 grs de farinha de quibe - 2 hs de molho em água e depois esprema, retirando toda a água,
1 alho poró (talo) grande, fatiado em rodelas finas,
4 ovos,
1 colher (sopa) de pasta de sal e alho - cheia,
1 cenoura ralada,
1 xícara (chá) de hortelã picada,
10 azeitonas pretas fatiadas,
1 xícara (café) de azeite extra virgem,
4 colheres(sopa) de alcaparras - sem a água de conserva.
salsinha e cebolinha seca,
1 cebola média ralada.


Misture tudo até que o ovo tenha sumido na massa e todos os ingredientes estejam espalhados. Coloque numa forma quadrada - média (o quibe fica com uns 3 dedos de altura), e como não cresce, tudo bem. Agora afunde com o dedo umas 12 bolinhas de queijo - muzarela de búfala. Faça demarcações de leve com a faca e coloque pra assar em forno quente - uns 260º, por 45' aproximadamente. Limão não pode faltar e uma baguete é boa companhia. 

O Barão - um admirador

 O Barão de Eschwege - 1777/1855, militar, ngenheiro e naturista alemão, após ter trabalhado em mineralogia na Alemanha, passou a serviço de Portugal, vindo para o Brasil por ocasião da transferencia da corte Portuguesa para o Rio de Janeiro, narra a partipação entusiasta de um grupo de ciganos na comemoração pública quando do casamento da Princesa D. Maria Teresa, primogênita do Principe Regente, com seu primo, Infante de Espanha, D. Pedro Carlos, a 13 de maio de 1810. O Barão informa: "Os ciganos foram convidados para as festas dadas na capital brasileira por ocasião do casamento da filha mais velha de D. João VI ... Os moços desta nação, trazendo a garupa suas noivas, entraram no circo montando belos cavalos ricamente ajaezados...Executaram lindos bailados que eu jamais vira...os dos ciganos como os mais agradáveis...
***
Nisso, um outro grupo salta na liça: os ciganos.
Guiando soberbos cavalos brancos arreados com igualdade e riqueza, balançando penachos implantados em discos de forma lunar, luzidos criados transpõem as barreiras.
Os bailadores trazem as bailadeiras à garupa: morenas, sedutoras como as profetisas gentias.
Os homens trajam jaqueta escarlate, calção de veludo azul, meias de seda cor de rosa, chapéu desabado de veludo com plumas, sapatos baixos de fivelas. As moças ajustam à cintura flexível costume de veludo, primorosamente bordado, calção, sapatos de cetim branco com ramagens de ouro; na cabeça, como um turbante de nuvens, um toucado azul, recamado de estrelas, como o diadema das noites do Oriente.
A embaixada cigana dirige-se ao palanque real; a música toca, e os corcéis, levemente fustigados, empinam-se no centro da planície, rodam, dançam a polca.
A multidão, contente do desempenho, manifesta-se com ruído.
Findos os primeiros exercícios, os pajens tomam da brida dos animais e conduzem os cavaleiros ao recinto do baile.
Aí, depois das cortesias à família real,"uma salva de castanholas marca o princípio do dançado... E, ao som das guitarras, o fandango espanhol peneira, arde e geme — mansinho como as ondulações de um lago, quente como os beijos das odaliscas, lascivo como as inspirações do poeta-rei.
Os dançarinos são vitoriados: flores, fitas, aplausos, eles os conquistam pela magia plangente de seus instrumentos, pela graça ideal de suas danças.
Dom João VI, participando do agrado geral, fá-los vir à sua presença. Uma banda de música precede-os na maior ordem.
Subindo ao pavilhão, dois camaristas trazem, estendidos num coxim de púrpura, os prêmios que lhes eram destinados: patentes militares aos homens e jóias às mulheres.
As ovações, os vivas a el-rei e as harmonias coroavam os artistas e a festa... Restabelecido o silêncio, voltaram jubilosos a seu palanque.
Preludiaram na guitarra uns acordes casados a vozes de uma cantilena em sua linguagem.
A tradição olvidou a toada e as letras... Para o sr. Pinto Noites, era o Canto egipcio.
Às 6 horas os clarins, à frente de enorme préstito, ecoavam na cidade. El-rei nosso senhor via as luminárias...
Uma mulher trigueira, no auge da aflição, olhando para uma cruz vermelha, pintada no alto de sua porta, fitou o rei na sua passagem, e, estendendo os braços, como que querendo repelir uma visão perseguidora, exclamou:
Jála-te, bengue! (vai-te diabo)!
 Morais Filho, Alexandre José de Melo. Os ciganos no Brasil e Cancioneiro dos ciganos. Belo Horizonte, Editora Itatiaia; São Paulo, Editora da Universidade de São Paulo, 1981 (Reconquista do Brasil, nova série, 59), p.25-33). 
 Arquivo Nacional - História Luso-Brasileira. 

Cozinha dos Vurdóns,
remexendo na história.

Comentários

  1. Muito interessante. Conhecia o Barão de Eschwege porque colaborou, a convite de D. Fernando, casado com a rainha D. Maria II (filha de D. Pedro), na elaboração dos planos para o Palácio Nacional da Pena (Sintra), entre 1836 e 1840. Devia ser um homem notável. Bjs!

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    1. E pelo visto foi Margarida, tem mais sobre ele no Arquivo Nacional, ele acabou retratando em cartas, um pouco da vida dos ciganos do Brasil e como não tinha um olhar carregado de preconceito, suas observações são muito mais leves e mais diretas nos costumes e modos reais daquela época.

      bjs nossos

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  2. Textos sempre com interesse.
    A receita...bem...muzarela de búfala? Como é feito?
    Agradam-me os ingredientes todos, menos esse.
    Sou como os garotos, não provo e digo logo que não gosto.

    Beijinhos amigos

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    1. Já percebí Isabel! A verdadeira muzarela é de búfala, sabia? depois é que vieram as vaquinhas ... pode comer sem susto, é agradável e de gosto bem suave, acho que até mais. Pode substituir por queijo da serra (DELICIOSO), EM QUADRADOS. Pode fazer sem, é que amamos queijo...TODOS.

      Deus conserve se parecer com os garotos, mais tira a muzarela disso.

      bjs grandes

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  3. São estimulantes estas visões contrastivas que a História nos traz. Ela, a História, é sempre um manancial de aprendizagens e de alimento para a reflexão.
    Por falar em alimento, não sei o que é quibe, queridas Cozinheiras. Mas tem bom aspecto e sou sempre adepta de novas experiências gustativas :)
    Beijinhos e boa semana para todas.

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    1. Assim sendo cara Sara, o quibe assado ou o frito, são feitos de farinha de trigo pra quibe ou quase um farelo de trigo. Não é refinada, com ela se faz o tabule, por exemplo. Pertencem a cozinha libanesa e árabe.
      Os relatos antigos são bem cheios das expectativas das épocas, seus valores e afins. Imagine, a mesma cena visto pelos dois, Debret pintava do palanque real, o Barão relata em meio ao povo. A mesma cena, olhares distintos.

      bjs grandes e boa semana

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  4. Sastipê,minhas queridas! Deve ficar muito saboroso este quibe!Só não gosto de alcaparras...rsrsrs O post de hoje é bastante interessante!Eu já tinha lido sobre o barão e suas opiniões à respeito dos ciganos.Simpatizo com ele!Quanto à Debret li sobre ele quando estudei História da Arte no Brasil na Faculdade de Artes e,li tb sobre a Missão Artística Francesa que acompanhou D.João VI...Jean-Baptiste Debret sempre me pareceu um pouco pretensioso e orgulhoso,certamente. Ser ótimo desenhista e artista famoso na época, elevava o "status" social de um indivíduo e lhe dava uma posição privilegiada nas Côrtes europeias.Mas,quanto ao caráter,se fraco,podia se corromper...Ele era um protegido de Napoleão e seu grande admirador .Era um homem da época(sécs XVIII e XIX),por isso também devia preconceituoso.Parabéns pelo artigo!Beijos em todas! Ando Sara!

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    1. Tire as alcaparras Cezarina, não ficaremos chateadas. Existe um ladinho qualquer de Debret que não nos encanta, talvez influenciado pelo próprio D João VI que não gostava nada dos ciganos, pensamentos de davam a ele respaldo na corte. Entretanto um artista pontual e de grande importancia para a época.

      bjs nossos

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    2. Você tá bonita na foto...parabéns.
      bjs

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  5. Já me ri duas vezes hoje. Com o comentário do post da porta e agora...
    Está bem, eu tiro a muzarela disso!!

    Beijinhos

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  6. Sem muito agradável

    saborear os vossos textos

    Boa partilha

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    1. Querido mar, não compreendi bem o que quiz dizer, mas acho que gostou...
      fiquei na dúvida.

      bjs nossos

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  7. É, eis um traço da história e de ambos os convidados, que nos colocam o quão diferente pode se posicionar uma pessoa diante da vida. Ainda bem que nos restou D. Pedro I, esse sim e efetivamente contribuiu com traços de simpatia e ajudou a modificar as coisas para os ciganos.

    um grande bj para todas, fiquemos o lado artístico de Debret.

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    1. Zerafim, sem dúvida Debret foi um dos grandes da sua época, fiquemos com isso. Quanto ao Barão, sua fala é limpa e gosto de relatos assim, mesmo que retratados de uma forma elegante da época, as falas são objetivas. Isso nos dá a possibilidade de vislumbrar a cena. Deve ter sido linda.

      js nossos e obrigada por vir.

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  8. Dois relatos, duas visões diferentes, a história funciona assim, tudo funciona assim.
    Outro factor muito prejudicial para os ciganos são as estúpidas generalizações, como se não houvesse de tudo em todos os povos e raças! Enfim, a verdade sempre acaba por triunfar, embora às vezes a um preço demasiado alto.
    A receita apetitosa, só falta fazê-la...
    Beijinhos, sete, e obrigada pelas saudades de alguma.

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  9. É assim mesmo Maria, na vida, no dia a dia de todos e em todos os lugares.
    De nada, pela saudade desta.

    bjs grandes e bjs da rainha

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  10. Deu-me um grande prazer ler esta postagem e as visões antagónicas sobre um povo, criadas no século XIX.
    A imagem é lindíssima. Gostei muito!
    Beijinhos para todas!
    :))))))))

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  11. Gostei das imagens.
    Fiquei tentada a experimentar a receita. Como sempre, deixam-nos com água na boca!
    7 beijos brilhantes

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  12. É fácil, gostosa e pode tirar o queijo desta também rsrsrsrs
    bjs de todas nós

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  13. Meus parabéns, eis uma aula de diversidade e bom gosto.

    um abraço,

    Sônia Mellim

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