UMA SOBREVIVENTE DO PORAJMOS



Bronislawa Wajs (1908 – 1987) 

Uma poeta com mais de 30 coleções de sua autoria, Papusza era uma fonte de força e esperança para a Roma durante a guerra.

Ela deu um testemunho imperioso sobre o porraimos (a devoração), extermínio dos ciganos nos campos de concentração nazistas, e sobre a vida escondida nas florestas durante a guerra na longa balada intitulada “Lágrimas de Sangue: tudo o que passamos sob o domínio alemão em Volhynia nos anos 43 e 44”. “Isabel Fonseca"

A declaração de Manush Romanov, ao final de uma visita aos ciganos em Sófia, sensibilizado com as condições do seu povo, transcrita pela autora, é significativa: “Enterrem-me em pé. Passei de joelhos toda a minha vida”.







Como nós padecemos sob 
os soldados alemães
                              
Volyn 1943-1944

Na floresta. Sem água, sem fogo - grande fome.
Onde poderia o sono das crianças? Sem tenda.
Nós não poderíamos acender o fogo durante a noite.
Por dia, a fumaça alerta os alemães.
Como viver com as crianças no frio do inverno?
Todos estão descalços ...
Quando eles queriam assassinar-nos,
primeiro eles forçaram-nos a trabalhos forçados.
Um alemão veio nos ver.
- Tenho más notícias para você.
Eles querem matá-lo hoje à noite.
Não diga a ninguém.
Eu também sou um cigano escuro,
de seu sangue - uma verdade.
Deus vos ajude
na floresta negra ...
Tendo dito estas palavras,
ele abraçou a todos nós ...

Para dois três dias sem comida.
Todos vão dormir com fome.
Incapaz de dormir,
eles olham para as estrelas ...
Deus, como é bonito de se viver!
Os alemães não vão deixar-nos ...

Ah, você, minha pequena estrela!
Ao amanhecer você é grande!
Cega os alemães!
Confundi-los,
desencaminhá-las,
para que a criança judia e cigana pode viver!

Quando o inverno grande vem,
o que a cigana com uma criança pequena faz?
Onde ela vai encontrar a roupa?
Tudo está se voltando para trapos.
Ninguém quer morrer.
Ninguém sabe, apenas o céu,
apenas o rio ouve as nossas lamentações.
Cujos olhos nos viam como inimigos?
Cuja boca maldita nós?
Não ouvi-los, Deus.
Ouve-nos!
A noite fria veio,
As mulheres ciganas de idade cantou
Um conto de fadas rromaní:
Inverno de Ouro virá,
neve, como pequenas estrelas,
cobrirá a terra, as mãos.
Os olhos negros vai congelar,
o coração vai morrer.

Tanta neve caiu,
cobria a estrada.
Só se podia ver a Via Láctea no céu.

Na noite de geada, tais
uma filhinha morre,
e em quatro dias
mães enterrar na neve
quatro filhos pequenos.
Sol, sem você,
ver como um cigano pouco está morrendo de frio
na floresta grande.

Uma vez, em casa, a lua estava na janela,
não me deixa dormir. Alguém olhou para dentro.
Eu perguntei - quem está lá?
- Abra a porta, meu rrom escuro.
Eu vi uma bela jovem judia,
tremendo de frio,
pedindo comida.
Coitadinho, meu pequeno.
Dei-lhe o pão, o que eu tinha, uma camisa.
Nós dois esqueceram que não muito longe
foram os policiais.
Mas eles não vieram naquela noite.

Todos os pássaros
estão orando por nossos filhos,
para que as pessoas mal, víboras, não vai matá-los.
Ah, o destino!
Minha sorte azarado!

A neve caía tão grosso como folhas,
barrados em nosso caminho,
neve pesada tal, ela enterrou o cartwheels.
Era preciso atropelar uma faixa,
empurrar os carrinhos por trás dos cavalos.

Quantas misérias e fome!
Quantas dores e estradas!
Quantas pedras afiadas trespassaram os nossos pés!
Quantas balas voaram pelos nossos ouvidos!

Traduzido do polonês por Yala Korwin.
Half-portrait of a Gypsy Boy by Franz von Defregger (1873)


COZINHA DOS VURDÓNS
NÃO É APENAS LENDA,
FOI REAL.

Comentários

  1. Sastipê! Parabéns pelo artigo!A história de Papuzsa foi muito triste...Há um tempo atrás(setembro/2011) postei a vida e a obra de Bronislawa Wajs no meu blog A MULHER NAS ARTES...Uma sobrevivente do holocausto que compunha versos e canções desde criança.(Aprendeu a ler e escrever, escondido de sua família)Contou em poemas o sofrimento de seu povo.
    Muito triste a sua vida,morreu solitária e esquecida de todos e é hoje considerada uma das maiores poetisas da Polônia!Muito bom o post de hoje!Congratulações! Beijos em todas!Devlesa!

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    1. Fica a mulher e o exemplo, acima da dor. A resistencia e a vitória de seus versos.
      O que poucos sabem é que antes de seu Kris romani, ela era feliz, ela conseguiu a superação e depois seu estado se agravou pela doença. Uma vida, uma mulher, uma rromí que venceu as barreiras do seu próprio povo e da devoração dos tempos.

      bjs grandes

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  2. Reitero o que já disse no anterior post: é necessário avivar a memória, há factos que não se podem repetir.

    Beijo :)

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    1. E assim caminhamos, porque andar é preciso. Bjs nossos e o nosso sempre muito obrigado pelo carinho e pela atenção.

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  3. Relatos surpreendentes, de dor,tristeza.
    Sempre as estrelas no céu, o canto, a união familiar.
    Como foi possível tanta dor?
    Como foi possível tanta injustiça?
    7 beijos brilhantes

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    1. As estrelas no céu Carlota, tudo começa por aí.

      bjs nossos, sempre.

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  4. Também na maior provação os seres humanos produzem os mais belos testemunhos; evidência de que a sua essência e humanidade transcendem as mais bárbaras situações. É urgente lembrar e, como diria o nosso grande Eugénio de Andrade, "é urgente destruir certas palavras/ ódio, solidão e crueldade/ alguns lamentos/ muitas espadas".

    Um forte abraço e bem-hajam pelo papel que cumprem em benefício de tão dignos e universais valores.

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    1. Eugénio de Andrade, "é urgente destruir certas palavras/ ódio, solidão e crueldade/ alguns lamentos/ muitas espadas".

      Essa frase estará conosco R, e agradecemos a sua compreenção de que antes de uma etnia ou outra, existem os valores humanos, a raça humana.

      7 bjs nossos

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  5. Amigas,

    Até custa arranjar adjectivos para tais comportamentos!
    Como podem existir seres humanos com tanta maldade, tão cruéis?
    Que persigam os outros só porque são diferentes deles e têm outro cultura? Podem gostar ou não, são livres para isso. Mas daí a massacra-los...
    Julgam-se e dizem-se superiores!
    Mas ainda os há!!

    Coragem e não desistam. Façam ouvir a vossa voz!
    Beijinhos

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    1. Ouviram os ouvidos do coração e os olhos da alma Cláudia. O preconceito é sem sombra de dúvida uma das maiores aberrações e doenças de todos os tempos. É composta de arrogancia, pobreza, leviandade, ignorância e tantos outros adjetivos, que como disse difíceis de encontrar.

      Apenas o conhecimento e a informação podem lançar seus braços sobre o assunto, do resto esperamos sempre um milagre.

      bjs grandes

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  6. Nota-se que é uma tradução, mas tem uma força incrível.
    Em Espanha há sobreviventes que refizeram as vidas,formaram uma família e procuraram ser felizes, e alguns só agora conseguem falar do quesofreram e viram sofrer. E outros nem isso, preferem levar à tumba recordações que os perseguem como a sua sombra, mas que são incapazes de contar. Temos que respeitar todas as reacções, mas alguém tem que contar tudo o que se passou, não pode cair no esquecimento nunca.
    Ver uma criança triste como a do quadro encolhe sempre a alma.
    Muitos beijinhos

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    1. É Maria, que bom que tem a sensibilidade de ver todas essas coisas, falar é imperiozo e muito difícil também.

      Que bom que existem pessoas como vocês no mundo (no nosso mundo e nas nossas vidas).

      bjs enormes de todas nós

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  7. Hoje coloquei no Blog da livraria, alguns livros sobre a Cultura Cigana.
    Pode ser que se vendam e que ajude a desmistificar este povo!

    Beijinhos

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    1. Se pudesse seria abraçada por 7 e com muitos beijinhos.

      Obrigada por se importar.

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  8. Gostei deste post. Já me tinham dado a conhecer a poetisa.
    Devia ser uma mulher extraordinária. Avançada para o seu tempo.

    Já vi no blogue da Cláudia, que os livros estão reservados. Todos! Pareceram-me interessantes.

    7 beijinhos

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    1. Devem ser mesmo Isabel, ou melhor, esperamos que sim.
      O Livro da Isabel Fonseca - ENTERREM-ME EM PÉ, é uma obra de respeito e atenção para com os povos da etnia rrom.

      Papusza foi extraordinária, o mundo sempre condena os heróis assim com a igreja queima as santas, mas um dia a terra gira e como as rodas do vurdón, o mundo amanhece.

      bjs grandes de todas nós.

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  9. Não consigo acrescentar nada ao que já foi dito apenas que a beleza está ´presente até nos momentos de maior horror.
    7 Bjs. :)))))))

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    1. Estas certa Ana, é isso mesmo. Apenas fiquei pensando que se não conseguissem a fuga naquele inverno de 43 e 44, teriam morrido no próximo, foram os mais rigorosos da floresta negra e nessa época muitas famílias alemãs figiam das tropas aliadas e morreram por lá.
      Ningem ganha numa querra, todos perdem, apenas a reconstrução, como as desse texto nos deixam mais fortes.

      bjs cara amiga.

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